sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Essa tal de Lica Moniz...

Foto: Kiki Moniz

Em um período do ano que costumamos falar do que se tem de melhor, não poderia escolher momento mais propício para traçar algumas linhas sobre a artista plástica Lica Moniz.
O cerne de sua produtividade tem uma forte ligação com o mar, elemento que deu suporte às suas duas últimas exposições. Estas, sob meu olhar, se complementam magnificamente.
Tempo de Fundo coagula o seu processo de Mestrado, pontilhado por uma crescente maturidade acadêmica e pessoal. É tangível as relações filosóficas e embasamento teórico na sua poética visual. Mesmo se tratando de fragmentos do espaço marinho, a leitura geral é concisa e faz uma ponte sólida entre o mar real e o virtual.
O Projeto Maraldi é um site specific que agrega a arte e a ciência de forma mais explícita, aqui representada pela arqueologia subaquática. Saindo dos espaços tradicionais e ressignificando um naufrágio, esta obra reverte os conceitos expográficos e revela o aumento de subjetivação que a artista delineou em Tempo de Fundo. Com o espaço marcado por luzes estanques, faz de um ponto o símbolo representativo da imensidão do mar e das possibilidades de acervo que ele guarda.
Com uma habilidade sutil de relacionar o micro e macro físico, de pensar em paralelo o coletivo e a solidão humana no mar psicológico, eis que vejo o melhor dessa ontogênese: a transformação de elementos triviais em arte.
Parabéns, Mergulhadora-Artista. Diante de tantas poças rasas que chapinhamos por aí, encontrar a profundidade do seu trabalho é digna de aplausos...
Tempo de Fundo 2. Foto: Kiki Moniz
Projeto Maraldi. Foto: Rafael Martins

domingo, 12 de dezembro de 2010

“Há sempre um copo de mar...”, só não sei se dá para navegar...


Arquivo pessoal - Tentando entender o mapa da  Bienal...
Patchwork como técnica é muito interessante, principalmente quando une elementos dos mais variados conceitos. Mas quando a linha de costura não une os pedaços, o trabalho não acontece de fato. E é assim que chega ao final a 29ª Bienal de São Paulo: uma colcha de retalhos desalinhavada, com R$30 milhões gastos em investimentos, 530 mil visitantes, um tema truncadamente explorado, e polêmicas estranhas, de urubus a luzes de néon.  As obras aconteceram individualmente, na sua razão de ser e estar como arte...logo, políticas por si. Algumas com excelente aporte conceitual, como o audiovisual  My African Mind, do angolano Nástio Mosquito, e o quase invísivel Apolítico, do cubano Wilfredo Prieto - instalação de bandeiras de vários países em preto e branco, tremulando ironicamente na frente do pavilhão. Outras já não foram tão felizes, como a versão “loja de departamentos” da obra Ninhos, de Hélio Oiticica, ou o Círculo de Animais , do chinês Ai Weiwei, onde de política ficou a trajetória do artista, a obra, quase que fofinha. Ainda estou tentando entender se o tema circunda o substantivo adjetivado Arte Política, ou se Arte e Política encontram-se substantivamente separados...Desconsiderando a dúvida e  lendo de forma crua a intenção dos curadores, o que resta de emblemática desta edição, acredito eu,  é a obra Abajur, de Cildo Meireles... Quando se trata de uma exposição do porte de uma Bienal, a costura precisa ser evidente, com linhas grossas, coloridas e bem apertadas, senão entre as folgas ficam visíveis o excesso quantitativo que não representa qualidade ou a museografia ineficiente. Ressalvo aqui o intuito da curadoria em dar liberdade ao visitante para fazer o seu circuito, mas sinalização adequada é status quo para um bom aproveitamento de qualquer acervo...
A minha deliciosa surpresa não veio deste megaevento de artes visuais tão esperado, e sim da Paralela 2010, que aconteceu nos galpões do Liceu de Artes e Ofícios. Ali sim arte e política (ou Arte Política) estavam a là overlock, sob o sugestivo nome de “Contemplação do Mundo”. Reuniu trabalhos das principais galerias do país, com obras de 82 artistas. Mesmo com o tema considerado  aparentemente vago  por alguns e a curadoria sofrendo a pressão tradicional de uma mostra neste formato, o resultado final dá um panorama eclético em suportes, mas em uníssono com a reflexão sobre a produção contemporânea. Ah, e claro, uma museografia simples, direta e que funcionou. Deixo aqui, no copo da Paralela 2010, este outro verso de Jorge de Lima, cujo Invenção de Orfeu canta "o poder de navegar, mesmo sem navios /mesmo sem ondas no mar".

sábado, 27 de novembro de 2010

Saudação à arte...

Saudação ao Sol - Imagem cedida pelo artista
Imagem cedida pelo artista
Em uma tomada silenciosa, as cidades tornaram-se suportes múltiplos do fazer artístico e uma simples caminhada pode ganhar ares de circuito expositivo. E como em qualquer mostra, estamos suscetíveis a certa amplitude estética, com a vantagem democrática da publicidade gratuita. Fazendo aqui um recorte no espaço público, proponho um passeio pelas obras do artista paraibano Erickson Britto. Em exibição no Centro Cultural dos Correios, no Pelourinho, a coletânea individual A ARTE E A CIDADE  traz um conjunto com variação interessante, desde jóias à esculturas de grande porte.
A visão de Erickson sobre a volumetria e geometrização se alia a uma organicidade muito particular, algumas vezes expressa em cor, como o vermelho vivo de “Saudação ao Sol”, obra exposta na orla de João Pessoa, que recepciona o astro-rei e o público com seus 4 metros em ferro galvanizado. Na série “Equilíbrio Vazio”, sua linearidade faz surgir ritmos, e o vazio se preenche com o olhar. Para os olhos também há o deleite das jóias, que merecem seus cinco minutos de observação. Outras esculturas tornam-se em lâminas de vidro e metal, aparas metalizadas, aço polido e escovado, em uma pluralidade de elementos formais e identificação de pensamentos próprios.  Arriscaria aqui dizer que o artista conseguiu um elo singular entre conceitos concretos e neoconcretos, com limpeza de formas e mobilidade orgânica em suas criações. Uma leitura urbanística subjetivada, onde ora ocupa, ora representa a cidade.

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Sampa

   A Maria Vernissage encontra-se em São Paulo para averiguar e, claro, ter algo a declarar sobre a 29ª Bienal e o mundo das artes visuais, que só quando cruza a Ipiranga e a Avenida São João...

domingo, 7 de novembro de 2010

Metáforas humanas.

Bicho Geográfico foto: Caetano Dias
    A Menina, o Cão e o Homem. Entes explícitos em uma película-looping onde os recônditos humanos se revelam sem pudores, apenas vestidos de beleza e dor. O cósmico, na figura de uma ninfa, passeia pelos vãos e corredores do Palácio da Aclamação, à procura de algo desconhecido, inominável, inalcançável. O telúrico é um cão paradoxalmente dócil e faminto. Ele caminha ao lado e ao largo da cosmicidade, a espreita do que o Humano-Homem irá oferecer. Em um banquete no Salão Nobre, o coração deste Homem é servido à finesse e leveza da mulher-sentimento e à rudeza e visceralidade do cão-emoção. Há momentos de feminina sexualidade fremente, disfarçada na forma de água, e a busca masculina ritmada pelas batidas do martelo no elemento terra. 
    Caetano Dias mais uma vez consegue a literalidade em imagens, com uma eloquência voraz, quase aos gritos, a respeito da natureza humana e sua historicidade. No site-specific  “Bicho Geográfico", o apolíneo e o dionisíaco dançam tango. Vale a pena a visita, mesmo com o desconforto térmico que o local de exibição oferece. Mas vá com fome. Fome nos olhos e na alma...

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Os passos que damos...

Fonte: http://enfermariadecampanha.blogspot.com/2008/05/minha-amiga-instabilidade.html
   A ausência  legitima o instável.  A não-percepção do corpo, dos limites, é que habilita a instabilidade na natureza, seja humana ou não.  E tão real que um chão forrado de tijolos móbiles, pequenos metros quadrados de apropriação cerâmica, nos estimulam a perceber os passos que damos na vida. Esta instalação, na exposição “CorpoCircuito” - de Áurea Madeira - é assim: incrivelmente simples.... e simplesmente incrível. Nos exige o olhar no caminho, nos passos. Nos permite ousar no desequilíbrio, e temer o equilíbrio. Quantos caminhos fáceis nos são cruéis ? E quantos complicados nos são libertadores? Outra obra são peças convexas colocadas sobre uma parede, ambos em branco. Antes de conversar com a artista sobre sua produção e saber que são moldes de joelhos, minha leitura foi de imperfeições em uma parede lisa, representando que nada pode ser plenamente perfeito, e que existe beleza justamente por isso. A terceira obra é uma ode muda à dificuldade: uma cadeira sobre uma pilha alta de tijolinhos, onde sentar se torna quase uma escalada. Na vida encontramos muitas cadeiras assim, às vezes até ocupadas ... Algo a se pensar com seriedade...Já que falamos em pensar, e com seriedade, isto é o que falta em determinados locais de ensino superior federal, onde a percepção da locomoção é no modo ausente. O gratificante na biologia humana é que todos estamos expostos a ter restrições no ir e vir por motivos vários, do assistente de serviços gerais ao diretor efetivo. Que tal exercemos a alteridade e buscarmos mudanças estruturais e arquitetônicas que permitam o livre trânsito de qualquer um, independente do nível de suas funções motoras, nos espaços de estudo? Estável ou Instável,qual será a opção do responsável legal da instituição?

domingo, 17 de outubro de 2010

Arte, logo existo.



    Neste jogo de cartas chamado vida, algumas pessoas saem da mesa cedo demais...Marcantonio Vilaça foi uma delas. Elemento fundamental na projeção da arte contemporânea brasileira  na década de 1990, este galerista  e colecionador foi responsável pela divulgação artística verde-e-amarela  no mercado internacional. Fazendo uma homenagem mais que merecida, o SESI, entidade integrante do Sistema Indústria, criou o Prêmio CNI SESI Marcantonio Vilaça para as Artes Plásticas,  que no período 2009/2010 promove sua 3ª edição.
    Eis os premiados, com as obras em exibição no Museu de Arte Moderna :
 - Armando Queiroz, o artista paraense que desnuda a violência, em vídeo-instalações e peças que raptam os olhos para o absurdo. Que tal observar o mercado Ver-o-Peso de um jeito único? Deliciosamente instigante.
-  Eduardo Berliner, do Rio de Janeiro, apresenta pinturas com bases em imagens fotográficas. Tem seu caderno de desenhos e camêra fotográfica como uma extensão de seus braços, aprecia a bricolagem e acha o mundo um lugar estranho. Um bom adjetivo. Estranho.
- Henrique Oliveira, de São Paulo, traz a poética do orgânico, do efêmero que teima em resistir. A percepção custa a acreditar que são peças produzidas com madeiras velhas, de tão sinuosas e maleáveis que aparentam ser. Também permite a releitura de nossa rigidez interna e de como é possível moldar o que queremos. Aplausos.
- Rosana Ricalde, carioca, é a artista com destaque na mostra de Salvador. Talvez como um presente, já que o mar tão belamente diluído nas suas obras foi de inspiração baiana. Ver suas obras é a redundância de  viajar pelas águas, seja com tipografia ou somente tinta. Suave.
- Yuri Firmeza, paulista cearense,  coloca o público para caminhar em volta de si mesmo sem perceber, forçando o atrito entre  o medo e a curiosidade do desconhecido. É ostensivamente arte política. Protesto aqui, deveria estar na Bienal de São Paulo. Sim, Bi-e-nal.
  Apresentações feitas, agora vamos pensar: se a arte é também como um jogo, então os prêmios de promoção artística são os mais disputados. Na mesa estarão o artista, o curador-crítico-galerista, o público e o espaço. Apostas e blefes vão acontecer, e com trapaças de todos os lados. Felizmente neste jogo nunca existirão vencedores, porque qualquer um que saia da mesa estará levando consigo uma parte necessária e essencial do sentido da arte. Hora de refazer as regras e entender o que significa união.

sábado, 2 de outubro de 2010

De cá para lá, de lá para cá.

Fonte: http://vivamaisviva.blogspot.com/2009/11/navegar-e-preciso.html
          Globalizar é criar transnacionalidades. É quebrar as linhas imaginárias que definem o eu e o outro em ilhas culturais e nos transportar pelo mundo. Que tal ser um Alemão no Chile,  um Francês no Paquistão ou, talvez, um Brasileiro na Islândia? A princípio a barreira que nos separa (quem sabe um dia será a única) é o idioma, tal qual um mar a ser singrado. Embarcando nesta navegação linguística, o Goethe-Institut e parceiros, como a Alliance Française, usam seus navios literatos com a habilidade  de quem sabe o que fazer para transportar conhecimento. Aqui lançou-se o “Salvador – Hamburgo: Passado e Presente da Globalização”, projeto multidisciplinar entre arte e desdobramentos acadêmicos, que permitem embarques e desembarques em portos variados. No da Fotografia é possível  apreciar o trabalho de quatro artistas: Cássio Vasconcellos, Gaio Matos, Bernd Kleinheisterkamp e Olivier Dubuquoy, sendo esta exposição o percentual mais vísivel de todo projeto, como a ponta de um iceberg... Teatro, Moda, Cinema, Literatura, estes se colocam um pouco mais escondidos, dependendo de um mergulho-catálogo para que aconteça a devida apreciação. De qualquer maneira navegar ainda é preciso. Só não sei se Pompeu ou Fernando Pessoa imaginariam o quanto...

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

SUB entendo.


É brain, meu bem. A violência está na sua cabeça (2008). Acrílica s/ tela. 120x180cm.
Cabeça Lunar (2009). Acrílica s/ tela. 120x180cm.
O Escritor (2008). Acrílica s/ tela. 120x180cm.
O Primeiro Sexo (2009). Acrílica s/ tela. 120x180cm.
      
Sublimemente subversa.  Assim está a composição SUB POP,  do artista plástico Luiz Badia, em exposição na Galeria ACBEU. São 8 telas em acrílica, onde misturam-se o abstrato com elementos pictóricos,  que estimulam e refazem nossas sinapses. Somos surpreendidos por cartoons, ready made, natureza, anatomia, arquitetura, mecânica, que se coadunam em quase sinfonia. É uma pincelada inteligente de Pop Art, ultrapassando o campo de ironias e estabelecendo comunicação com um conjunto de informações inerentes a sociedade mundial. Vale a pena deixar os neurônios seguir as pistas, tal Sherlock Holmes, e desvendar os segredos não ditos nos quadros deste artista. Muito bom, Luiz, muito bom...

sábado, 11 de setembro de 2010

Por um humano mais mundo...


No viés do meio ambiente e seus desdobramentos está acontecendo, na Galeria Cañizares, a Exposição Ecológica  Move Arte, um dos componentes da 37ª Jornada Internacional de Cinema da Bahia.  É uma tentativa apreciável, onde Arte e Ecologia são colocadas em suportes variados, de tela à performance. Encontraremos trabalhos de Ayrson Heráclito, Baldomiro, Chico Mazzoni, Grupo Três Cabeças, Juraci Dorea, José Henrique Barreto, Justino Marinho, Ligia Aguiar, Luiz Claudio Campos, dentre outros. Apesar de admirar estes trabalhos pelas leituras transmutadas em relação à natureza, o efeito geral desta exposição é de baixo impacto.
   A bandeira do estilo coletivo de “Salve o Verde” já está puída nas bordas. A defesa do meio ambiente no Brasil faz um caminho contrário, exaltando primeiramente as ações públicas (no geral, ineficientes) em detrimento das ações individuais, causando dificuldades em entender qual o papel de cada um no todo. Ninguém é beija-flor, aquele morreu queimado por questões de logística. O que somos é a parte compositiva, de atuação constante, fazemos o  próprio meio ambiente. Uma nova postura, sem reverberações pavlovianas e ecologicamente coerente, nasce das atitudes no dia-a-dia, desde o copo e sacola plástica que deixamos de utilizar em excesso até o tipo de alimento que consumimos. É assim que brotam os fios que trançarão o termo sustentabilidade. E a Arte é um dos fios que formam esta trança. Aparece, seja de forma suave ou violenta, permitindo ao humano apreender o mundo. Então humanos-artistas, utilizem esta via de comunicação  e pensem além do óbvio. Afinal, o planeta é feito em cores com formatos múltiplos e não é só de clorofila que se alimenta Gaia.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

O Baiano e o Mineiro



Além da xilogravura ter sido um dos primeiros suportes para impressão de cartuns no séc XIX, o que mais em comum, entre estas duas técnicas, podemos encontrar?
As exposições em exibição na Caixa Cultural.
Hélio Lage, artista baiano das charges e cartuns,  era dos bons e faz muita falta para o riso pelo mundo afora...Mas, como todo bom baiano, fez amigos-irmãos na sua estrada de vida e é um destes, o Nildão, quem nos traz o grande presente: a Mostra “40 anos de Humor”. A essência do trabalho de Lage tem cheirinho de acarajé, de tão típico que é o desenho apresentado. Personagens locais, políticos, artistas, esportistas, pouco escapou ao traço sátiro deste humorista. Até rima. E mais que rima, é também traçados de beleza, humanidade e preocupação social. Um artista completo, com salada, vatapá e camarão.
Subindo a escada, a tradição da xilogravura ganha notoriedade com este mineiro chamado Rubem Grilo. Sem pururuca e pão de queijo, mas com muita técnica e habilidade, o artista apresenta 25 anos de trabalho onde a dramaticidade e o cotidiano andam em paralelo. Cada gravura é sui generis, com caos na imagem e ordenação no conceito, forçando um salutar exercício de compreensão.  Sem dúvida, é o maior gravador brasileiro vivo, e generoso com o conhecimento.
Já que aqui falamos de generosidade, este sentimento  precisa ser estimulado entre as pessoas que trabalham com e para os espaços voltados à arte. É muito importante lembrar que as exposições não vivem apenas das aberturas e das taças de espumante servidas, mas sim do público que aprecia e legitima o trabalho artístico apresentado. E entendo como público todas as pessoas que visitam o espaço, sejam famosos ou não, ricos ou não,artistas ou não.  Deixo  aqui a reflexão para a Caixa Cultural ...

sábado, 4 de setembro de 2010

Tunga e a rede



  No mundo globalizado, onde o ente virtual aracnóide chamado internet nos encasula em excesso de informações, apreciar o trabalho de Tunga é redimensionar o que nos cerca. “ À Luz de Dois Mundos” traz para as terras da Bahia um trabalho com leituras conceituais que saltam das peças para o público em muitas direções.  Quem vê é que decide o que pensar, o que destacar, com o que se deslumbrar, e isto só é possível diante da singular pluralidade deste artista. As conexões  e amplitudes entre historicidade e ambiente, sagrado e profano, o bem e o mal, permitem uma apreensão democrática, onde qualquer um sairá da exposição com um pedaço da obra preso entre os neurônios. Acredito que esta exposição ultrapassou ricamente a proposta inicial do Quarta Dimensão, onde a tridimensionalidade ganhou ares de coadjuvante com a atuação primorosa entre crânios, ossos, metais, e....redes.

Para mais informações sobre o artista e esta obra : 
http://dimusbahia.wordpress.com/2010/08/27/tunga-no-jornal/

terça-feira, 31 de agosto de 2010

Em uma certa esquina do Pelourinho...

   
  O Centro Cultural dos Correios tem me surpreendido nas últimas exposições que fui. E surpresas boas, muito boas. Isabel Gouveia, Lygia Aguiar e agora Chico Mazzoni. Este múltiplo artista plástico traz nesta mostra telas com acrílica em baixo-relevo, que causam um efeito quase lúdico. Eu particularmente quis correr os dedos por suas “cidades invisíveis”, e torná-las vísiveis aos meus sentidos. Quis correr os espaços como Marco Pólo, enquanto narrava ao Kublai Khan o desconhecido. Senti-me dentro d’água com “Águas I”, microscópica em “Via quase visível” e por pouco não busco o homem-morcego em “Gotham City”... Aconselho a visita com tempo, pois enxergar o invisível requer uma boa dose de crença e disposição...
   Pertinente falar aqui que a arte na Bahia, seja feita por artistas natos ou aqui pousados de outras paragens, está sendo acalentada por espaços que merecem aplausos.E o Centro Cultural dos Corrreios é um destes espaços. Então, que sejam públicos ou privados, dinheiro meu ou seu, o resultado é o que importa: tornar a arte visível a todos.

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Uma viagem com gosto de fotografia...


   

     O Tempo com várias facetas...este foi  o  prazeroso guia que me acompanhou  na viagem que fiz pela sexta edição do A Gosto da Fotografia. Comecei com asas nos pés, indo ao MAM apreciar “O Tempo Dissolvido”.  Através dos olhos de Thomaz  Farkas vi recortes de seis décadas de trabalho, que  resultaram  em espelhos de reconhecimento de um Brasil mais que humano, e não esperaria menos do mais humano dos fotógrafos...Pegando carona com um zéfiro que passava, cheguei ao Museu de Arte da Bahia, sentindo o cheiro do realismo fantástico de Boris Kossoy. Nestra mostra,  intitulada “O Caleidoscópio e a Câmara” pude ver alguns pedacinhos de vidro chamados Manaus, São Paulo e Salvador, que formaram um padrão geométrico digno de aplausos. Uma aula de viver, em 40 anos de registro, deste fotógrafo-pensador.   
      Seguindo algumas migalhas de pão intelectual, encontrei o Museu da Misericórdia , e nos recônditos do seu espaço, deparei-me com uma das últimas homenagens feitas a Mário Cravo Neto, por Sabrina Pestana, com imagens completamente despidas de máscaras...realmente: Sem Ponto Final.  Com a técnica do light painting, Ana Lúcia Mariz me convenceu, com um fio de luz, de memória, a passar pelos seus espaços retratados e sublimar o desgaste que exibem. E então vi sua Alma Secreta... Seguindo os sons de sorrisos abertos e peles brilhantes entrei no Solar do Ferrão e trilhei a ponte feita por Ricardo Teles entre a Bahia e a África.  De repente me dei conta que não sabia qual era O Lado de Lá ou de Cá. Infelizmente a dor surgiu no Portal do Não Retorno, mas foi bom, afinal, são as dores que nos fazem lembrar do que não devemos fazer de novo...
   E o Tempo-guia, que inexoravelmente segue para frente, abriu uma exceção e me levou a um campo de juventude, de começos e de esperanças: o Espaço OI Kabum! que, em parceria com a CIPÓ e a UNESCO, promove a formação de jovens carentes para o uso de linguagens multimídias. Com eles fui  ver o Pelô, entretida em uma revista bacana produzida pelos estudantes, e descobri as pessoas que lá existem além do turismo. Também com eles  vi “Caymmi na Lata”, um projeto de releitura poética da obra de Dorival Caymmi através de fotos feitas com pinhole*. E o resultado foi tão mágico quanto a captura das imagens...E é com este sabor do ver, do conhecer, do apreciar que deixo esta viagem e cedo o lugar a vocês....se permitam, vão com gosto! Au revoir...

* Técnica que utiliza uma lata ou caixa pintada internamente de preto e revestida com papel fotográfico, onde a luz entra através de um pequeno orifício, promovendo assim a formação de uma imagem neste papel.

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

No Palácio da Aclamação tem fantasmas...


       É um imenso prazer  (tim-tim, na taça com prosecco) inaugurar o Maria Vernissage. Aqui será um espaço para a divulgação e discussão - por que não?- do que acontece no campo das artes visuais em Salvador. Para iniciar nossa conversa tenho que parabenizar a Dimus e o (fofo) Daniel Rangel pela injeção cultural que esta cidade debilitada estava necessitando, e que continuem em doses alopáticas! 

      O Programa Ocupas, com montagens site specifics, vem trazendo ao nosso deleite artistas como José Rufino e Carlito Carvalhosa, e agora temos Eder Santos. Sim, artista renomado, que utiliza a linguagem audiovisual para comunicação e carimba nesta mostra sua habilidade e criatividade com os recursos high tech tão tipicamente seus.
       Descreverei aqui o trajeto que fiz e admito que me surpreendi...Primeiro o Salão Nobre, que apresenta a Galeria das Almas. Confesso que esperei totens gigantes com suas nuvens dançantes e encontrei algo em torno de 1,70m...Depois de cinco minutos observando o ambiente, esqueci o (pré)conceito e me deliciei com o contraste entre o espaço rococó e as peças futuristas. Ah! Fica melhor ainda se conseguirem visitar com quase ninguém por perto. Ainda no Salão Nobre encontramos a obra Humilhação, um conjunto criado entre o genuflexório pertencente ao acervo do Palácio e um quadro onde se projeta  o trecho estático de um vídeo, onde vemos duas mulheres. A estrutura desta imagem me lembrou um daqueles livros infantis com holograma, onde o mexíamos e a capa mudava o desenho. Algo curioso: ao lado do genuflexório tem uma....concha. Declaro humildemente que não entendi a concha. Saí um tanto tensa, talvez fossem os acordes dodecafônicos da trilha musical, ou a incômoda sensação de ser perscrutada por aqueles dois pares de olhos...vale a experiência. Já a Geografia das Sombras, diretamente pensada para a Sala de Banquetes, foi um mergulho olímpico em contos de Edgar Allan Poe. A visualização dos pássaros no teto com suas sombras em movimento é.........vai visitar. Acredito que o único sentimento que esta exposição não irá causar é arrependimento. Até a próxima!!