quinta-feira, 25 de outubro de 2012

II Seminário Baiano de Crítica de Artes


"A Fundação Cultural do Estado da Bahia (FUNCEB), entidade vinculada à Secretaria de Cultura do Governo do Estado (SecultBA), dá início às ações que integram o segundo ano do Programa de Incentivo à Crítica de Artes. Nos próximos dias 29 e 30 de outubro, o II Seminário Baiano de Crítica de Artes vai reunir profissionais brasileiros reconhecidos no campo para discutir a crítica de artes, com a proposta de divulgar a importância e os aspectos desta produção, agregar profissionais e estimular o interesse de novos autores críticos. O Seminário acontece no Espaço Xisto Bahia (Barris – Salvador), sempre das 9 às 13 horas. A entrada é gratuita, aberta ao público até lotação da sala e os interessados em garantir vaga devem fazer pré-inscrição pelo site www.fundacaocultural.ba.gov.br/criticadeartes. Para aqueles que não puderem se fazer presentes, os dois dias do evento terão transmissão ao vivo através do Portal do IRDEB (http://www.irdeb.ba.gov.br/), com apoio da Diretoria de Audiovisual (DIMAS) da FUNCEB, permitindo também o acesso de pessoas do interior do estado e de todo o país."

domingo, 21 de outubro de 2012

Roteiro cronológico das invenções de Abraham Palatnik, por Frederico Morais



Abraham Palatnik, Galeria Nara Roesler, São Paulo, SP - 19/10/2012 a 24/11/2012

Aparelhos cinecromáticos

Entre 1949 e 1950, constrói seus dois primeiros aparelhos cinecromáticos. Azul e roxo em primeiro movimento, exposto na I Bienal de São Paulo (1951), tinha 600 metros de fios elétricos, servindo a 101 lâmpadas de voltagens variadas, que movimentavam, em velocidades desiguais, alguns cilindros.
Para o crítico Mário Pedrosa, que cunhou o termo cinecromático, era a primeira tentativa, no Brasil, de realizar a utopia artística de Moholy-Nagy, que consistiria na criação de “afrescos de luz destinados a animar edifícios ou paredes com o dinamismo plástico da luz, segundo a vontade e a inspiração criadora do artista”.
Até 1983 Palatnik realizara 33 aparelhos cinecromáticos, expostos em sete edições da Bienal de São Paulo, entre 1951 e 1963, e nas bienais de Veneza (1964) e Córdoba (1966), e em mostras individuais e coletivas na Europa e nos Estados Unidos. O oitavo aparelho, uma sequência de imagens verde-laranja que durava quatro minutos, exposto no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1960, apresentava uma série de inovações técnicas, como a miniaturização do centro de controle automático, a redução da fiação elétrica para 60 metros e o número de lâmpadas para 51, além da introdução de uma central de controle automático.
Com seus aparelhos cinecromáticos, Palatnik não só se antecipa à vertente construtiva, que eclode com os grupos Ruptura (São Paulo, 1952) e Frente (Rio de Janeiro, 1954) para se consolidar com o Concretismo (1956) e o Neoconcretismo (1969), mas também funda a vertente tecnológica da arte brasileira.
Vistos na Bienal de Veneza, foram apontados como obras pioneiras no âmbito da arte cinética internacional, no que diz respeito ao binômio luz-movimento. O crítico Jürgen Morschel, comentando a exposição de Palatnik no Museu Saint Gallen, Suíça, em 1965, escreveu que ele “não executa objetos, encena acontecimentos”, definindo-o como um “regisseur”. Frank Popper, apresentando a mostra Kunst-Licht-Kunst, realizada em 1966 no Museu de Arte de Eindhoven, Holanda, refere-se aos “móbiles luminosos” de Palatnik, destacando a “veia poética” de suas pesquisas. No ano seguinte, confirmaria o pioneirismo de Palatnik no campo das pesquisas de luz e movimento, em quadro sinótico estampado no seu livro Naissance de l’Art Cinetique. Pierre Cabanne e Pierre Restany também reafirmaram, no livro L’Avant-Garde au XXe Siècle (1969), as antecipações de Palatnik tanto em relação aos “lumidynes” de Frank Malina, quanto às pesquisas de dinamismo espacial de Nicolas Schöffer. Tomás Maldonado, líder dos concretos-invencionistas argentinos, saudou seu colega brasileiro como “o mais importante precursor do último retorno à estética da luz e do movimento”. Mari Carmen Ramírez, curadora da monumental exposição Heterotopias – Medio Siglo Sin-Lugar 1918-1968, realizada no Museu Reina Sofía, Madri, em 2001, foi a última figura exemplar da crítica da arte a reafirmar o feito de Palatnik.

Pinturas sobre vidro

Em 1953, Palatnik participa da I Exposição Nacional de Arte Abstrata, no Hotel Quitandinha, em Petrópolis, com pinturas realizadas sobre vidro, associadas a incisões feitas com estiletes sobre matéria pintada. Feixes de linhas precisas, mesmo quando ondulantes, gravitam sobre a superfície ou se superpõem, numa sucessão horizontal de faixas, num caso e noutro sem afetar o caráter planar da obra.
Ou como na obra Sequência com intervalos, de 1954, buscando um diálogo mais sensível entre cor e linha, criando profundidades insuspeitadas. Palatnik integrou algumas dessas pinturas sobre vidro à parte traseira de poltronas de jacarandá, espuma e tecido por ele projetadas e expostas em três das quatro mostras realizadas pelo Grupo Frente, em 1954 e 1955.

Campos magnéticos

Palatnik não integrou o Neoconcretismo, mas absorveu alguns de seus postulados, como a participação do espectador no desenvolvimento da obra criada pelo artista. Assim, aos aparelhos cinecromáticos seguiram-se, em 1959, alguns trabalhos nos quais explora as possibilidades estéticas dos campos magnéticos, que incluem, em alguns casos, a participação lúdica do espectador. Em um desses trabalhos, Mobilidade IV, bolinhas de madeira são movimentadas, silenciosamente acionadas por eletroímã.

Quadrado perfeito

Em 1962, Palatnik projetou e patenteou o jogo que ele denominou Quadrado perfeito, exposto pela primeira vez na Galeria Barcinski, no Rio de Janeiro, e, nove anos depois, na mostra Arte Programatta e Cinética, realizada em Milão. Trata-se de um jogo baseado no deslocamento de peças sobre um tabuleiro semelhante ao que se usa no xadrez. No entanto, dele difere na medida em que não existem peças a serem capturadas ou xeque-mate, tampouco uma posição inicial rígida. Seu jogo pede mais percepção que raciocínio.
O jogo domina de ponta a ponta a obra de Abraham Palatnik, adquirindo formas variadas em função dos programas preestabelecidos. Nos aparelhos cinecromáticos, é o infindável fazer/desfazer dos movimentos, o manchar/desmanchar das cores. Nos objetos cinéticos, um jogo de simetrias e assimetrias prolongando movimentos silenciosos. No objeto lúdico, o ganho do jogador é o resgate da forma geométrica original. No jogo acima comentado, o ganho é a percepção do quadrado perfeito. Um artista como Palatnik é a perfeita ilustração do homo ludens de que fala Huizinga.

Relevos progressivos: madeira

Ainda em 1962, deu início à primeira de uma série de “relevos progressivos”, cada uma delas identificada por uma matéria-prima. A primeira escolhida foi a madeira.
Visitando uma marcenaria, Palatnik observou que os fragmentos de troncos de madeira espalhados pelo chão, abertos longitudinalmente, constituíam uma informação espontânea da natureza. A progressão de nós constitui um registro inevitável de situações de crescimento. Vale dizer, a própria natureza cria, no interior da madeira, padrões visuais: tonalidades, grafismos, manchas. Decide, então, disciplinar esteticamente essas formas ou padrões naturais, pretendendo, com isso, “atingir os sentidos do homem, ativando sua percepção”.
Essa questão é retomada por Palatnik, em entrevista que me concedeu (“Palatnik, artista e inventor: A arte não deve transmitir mensagens, mas ter vida própria”, O Globo, 1981), na qual afirma: “Minha função como artista é disciplinar o caos em nível da informação. As informações no universo estão geralmente ocultas, disfarçadas em meio à desordem. É necessário um mecanismo de percepção e da intuição para que estas se manifestem. É a esta ‘surpresa’ que tenho colocado meu interesse. Inicia-se o processo de permuta e, por meio da tecnologia adequada, procuro disciplinar as informações”.
Nos primeiros trabalhos, a preocupação dominante era enfatizar a ideia de progressão do ritmo horizontal-ondulatório que, cobrindo todo o plano bidimensional, sugere uma expansão virtual para além das bordas do quadro. Vieram, mais tarde, trabalhos nos quais a progressão é parcialmente substituída, ou melhor, ela surge acoplada à ideia de simetria, na medida em que as lâminas da madeira formam determinados núcleos ou áreas/manchas que se opõem simetricamente.

Objetos cinéticos

Palatnik constrói seus primeiros Objetos cinéticos, constituídos por hastes ou fios metálicos, tendo em suas extremidades discos de madeira, pintados de várias cores, e placas que se movimentam lenta e silenciosamente, acionados por motores e, em alguns casos, por eletroímãs. Neles só existe movimento; os objetos cinéticos encontram-se mais próximos da escultura e do desenho; os aparelhos cinecromáticos, mais próximos da pintura e do cinema. Nos aparelhos, a engrenagem mecânica e elétrica é invisível, reforçando a sensação de animação pictórica. Nos objetos cinéticos, ela ganha visibilidade, integra o campo visual, indicando que Palatnik procura dar à própria mecânica uma dimensão estética. Nos aparelhos, a metamorfose contínua de formas e cores – dinamismo plástico – provoca efeitos de cinestesia. Nos objetos, o movimento provoca encantamento.
Aparelhos e objetos são máquinas de criar arte e foram construídos com o mesmo rigor e espírito lógico, mas os primeiros sugerem maior ordenação e controle. Os objetos parecem mais espontâneos, como se, neles, o acaso interviesse. É certo que os objetos cinéticos se movimentam com a ajuda de motores ou eletroímãs, mas o espírito que os anima é o do móbile, que é também máquina, mas acionado por uma fonte de energia natural que lhe confere frescor, leveza e lirismo.

Objeto lúdico

Em 1965, Palatnik retoma a pesquisa com campos magnéticos, criando um objeto lúdico, que consiste na colocação sobre uma base circular, de vidro, de formas geométricas de cores diferentes, acionadas diretamente pelo espectador, através de um bastão magnetizado. Vale dizer, Palatnik usa os polos positivo e negativo dos ímãs para atrair ou repulsar as formas geométricas que constituem fragmentos de uma estrutura maior a ser armada pelo espectador-participante. Trata-se, no limite da interpretação, de um jogo.

Relevos progressivos: papel cartonado

A partir de 1968, Palatnik passa a empregar, na construção de seus relevos progressivos, o cartão dúplex. Mas, em vez de usar a superfície do papel, superpõe várias folhas, criando um aglomerado que, em seguida, é fatiado pelo topo. Nessa tarefa, emprega um mecanismo de facas duplas. Seus relevos, em diferentes profundidades, resultam em estruturas óticas, em cujos interstícios a luz perpassa, criando áreas mais ou menos iluminadas ou que parecem fechar-se ou abrir-se em função do próprio deslocamento do espectador. Palatnik explora, em seus relevos, o excesso e o fausto visual, evitando o vazio, como nas igrejas setecentistas do barroco universal. Emerge algo de sacral nesses relevos, e isso fica mais evidente quando substitui o cartão pelo metal dourado.

Objeto rotativo

Em 1975, Palatnik inventou o que chamou de Objeto rotativo – uma peça de resina de poliéster, medindo 12 x 2,5 x 0,8 centímetros, que, em função de uma pequena distorção num dos lados da parte inferior, inverte sua rotação. Impulsionada pelo usuário sobre uma superfície horizontal, lisa e dura, a peça, depois de um arranque no sentido horário, reage, fazendo o movimento contrário.

Relevos progressivos: cordões

Nas décadas subsequentes, Palatnik empregaria sucessivamente três novos materiais: nos anos 1970, a resina de poliéster; nos anos 1980, cordões sobre telas; nos anos 1990, um composto de gesso e cola. Com esta última, levada à tela com ajuda de uma bisnaga cujo bocal serve de pincel, inunda o espaço com um grafismo vibrátil e colorido, mas ainda de caráter progressivo. Nas progressões com resina de poliéster, explora, antes de tudo, a transparência do material.
Em 1981, por ocasião da primeira exposição das progressões realizadas com cordas sobre telas pintadas com tinta acrílica, Palatnik dizia tratar-se de “uma tentativa de organizar a superfície de uma maneira diferente dos procedimentos normais, introduzindo uma dinâmica através da cor”. Eu acrescentaria: uma dinâmica através da cor e da linha. Com efeito, alguns trabalhos da série estão compostos apenas de cordões cobertos pelo mesmo branco que serve de base às demais pinturas. E, fazendo uso apenas do branco, Palatnik reforça a estrutura linear que tensiona os ritmos ótico-cinéticos, que é a constante de toda sua obra. Contudo, diferentemente das progressões construídas com lâminas de jacarandá, que tendem a uma expansão horizontal, como se fossem um Muybridge abstrato, nas progressões com cordões, o impulso é para o alto, como se ele quisesse expressar, ao mesmo tempo, a sonoridade cromática do teclado luminoso de Scriabin e o ímpeto ascensional das colunas que crescem como florestas no interior das catedrais góticas.

Pinturas a duco sobre cartão (1988)

Sempre fugindo do pincel e dos pigmentos, Palatnik realizou, em 1988, uma série de dez pinturas a duco sobre cartão, que é, a seguir, colado sobre chapa de fibra de madeira. Essa tinta industrial já fora usada por alguns integrantes do Grupo Frente, como Ivan Serpa, porque ela atende melhor às exigências de uma pintura geométrica, de cores puras e lisas. Uma pintura não contaminada pela subjetividade do pintor. As dez pinturas da série, todas medindo 37,5 x 37,5 cm, foram reunidas em uma caixa de madeira, como se fora uma coleção ou museu portátil. Se as progressões são um momento de expansão barroca do artista, esta série pode ser vista como um interregno de pintura concreta.

Cracol

Em 1988 coordenei, a pedido da Secretaria de Turismo do Rio de Janeiro, um concurso fechado para a criação e implantação de uma escultura subaquática para o mar de Angra dos Reis. Convidei Abraham Palatnik a participar. Acostumado desde muito jovem a enfrentar os mais diferentes desafios, aceitou, com entusiasmo, o convite inusitado, projetando uma escultura que não deveria ser simplesmente mergulhada no mar, mas a proposta de um “encontro flutuante” do mergulhador com a obra. Acompanhando a própria dinâmica da escultura, o mergulhador percorrê-la-ia por dentro e por fora, extraindo do percurso uma vivência ao mesmo tempo sensorial e lúdica. A obra, que foi projetada para ser construída com chapas de aço naval, portanto, ecologicamente inócua, conviveria com a fauna e flora subaquáticas. Associando a forma geométrica em espiral de sua escultura ao caracol e à craca, que com o tempo iria fatalmente se colar à superfície da obra, Palatnik denominou-a Cracol. Nenhum dos cinco projetos apresentados, inclusive o premiado pelo júri, logrou ser executado. Uma pena.

Série W

Por volta de 2004, Abraham Palatnik deu início a uma nova série denominada simplesmente W. À primeira vista, trata-se de mais um desdobramento de seus relevos progressivos. E é. Mas vai além, ao propor uma discussão sobre a ativação do suporte, sua materialidade, diante da ocupação abstrata e/ou figurativa da superfície.
Nara Roesler foi a primeira galerista a expor trabalhos dessa nova série, que eu analisei em texto para o catálogo da mostra realizada entre dezembro de 2004 e janeiro de 2005. Já afirmei, mais de uma vez, que Palatnik é um artista de tipo novo, que não se contenta em amassar, sem inovar, o mesmo pão da história da arte. E continuou sendo, mesmo quando, em leituras apressadas, muitos viram, já nos primeiros trabalhos da série de relevos progressivos, um retorno à velha pintura. Esta ele já abandonara, definitivamente, após ver os trabalhos geniais realizados pelos artistas esquizofrênicos do Centro Psiquiátrico do Engenho de Dentro. Ao iniciar a série de relevos progressivos, em 1962, ele afirmou que retomou a bidimensionalidade do plano para realizar o que definiu como uma “disciplina de superfície”. Descartou, então, não apenas a figura, mas tudo aquilo que tradicionalmente se identifica com a prática da pintura: cavalete, pincéis, bisnagas, desenhos preparatórios etc.

Transcrevo a seguir o que escrevi sobre mais essa invenção de Palatnik. A obsessão pelo conteúdo foi um dos motivos principais das críticas dirigidas à iconologia, definida por Erwin Panofsky como um braço da história da arte que se ocupa do tema por oposição à forma. Ora, um quadro é composto por duas realidades interligadas. Um suporte material e uma superfície que o pintor ocupa com figuras, paisagens, objetos ou formas. Ao longo dos séculos, apenas a superfície, enquanto receptáculo da imagem, foi motivo de valorização e de estudos. Eis que alguns artistas contemporâneos passaram a trabalhar no sentido da decomposição dos elementos materiais do quadro, o que determinou o que foi chamado de “ruína da imagem”, com a destruição do espaço ilusório. Em outras palavras, a intenção desses artistas era substituir a iconologia por uma materiologia. Ou, no dizer de Jean Clair, “o quadro desaparece como lugar de uma encenação, para renascer em sua fisicalidade de suporte e de superfície. A obra não mais encarada como objeto de um saber, mas como objeto para um saber”.
A prática desenvolvida por Palatnik na realização de seus novos trabalhos tangencia a de alguns integrantes do grupo francês Support/Surface, mas visa alcançar outros objetivos, convergentes com o conjunto de sua obra. De fato, ele começa espraiando a tinta acrílica sobre a madeira, criando diferentes áreas de cor. Em seguida, o suporte entintado é fatiado a laser e, com as tiras resultantes do corte, cria novas estruturas visuais. As linhas nascidas da junção das tiras de madeira reativam a cor, dinamizando a superfície como um todo. Um programa previamente definido associa progressão horizontal e deslocamento vertical. Com os objetos cinéticos, Palatnik trouxe a primeiro plano a materialidade da mecânica da obra, que se iguala em beleza aos efeitos visuais. Com a série W, suporte e superfície constituem uma unidade indissolúvel.

Coco-babaçu e farinha de peixe

Palatnik inventou e patenteou diversos mecanismos industriais e os dois jogos já referidos. Um problema vital para a economia de certas regiões do Nordeste era como quebrar o coco do babaçu, para dele extrair a semente, que será transformada industrialmente em óleo. Em 1952, depois de seis meses pesquisando, conseguiu produzir uma máquina que quebrava o coco sem comprometer a integridade da semente. Em 1968, projetou dispositivos para agilizar a alimentação das máquinas de produção de farinha de peixe. No mesmo ano, encontrou uma solução econômica e menos poluente para a reembalagem de um pó especial para obturação de dentes.
Durante muitos anos, dividiu seu talento entre a criação e a fabricação de objetos decorativos (bichinhos de poliéster), exportados para catorze países da Europa e Ásia, e sua arte. “Todas as minhas invenções industriais foram posteriores à invenção do aparelho cinecromático”, disse-me na mesma entrevista. Em um dos seus raros textos escritos, Palatnik sustenta que “Para inventar alguma coisa, é preciso possuir um comportamento anticonvencional. Eu acho que as indústrias deveriam convocar artistas plásticos, porque eles possuem um potencial perceptivo que pode resolver inúmeros problemas”.
Em algum texto, cujos título e localização me escapam, Mário Pedrosa escreveu: “Os artistas revolucionários de nossos dias serão inventores, ou não o serão, mas inventores como os arcaicos, que, locados da ingenuidade das crianças, criam, destruindo seus brinquedos, e nutridos de pura imaginação, de si mesmos se esquecem, à eterna procura da pedra filosofal, nos equívocos alambiques onde ciência e magia hoje se confundem”.
Seu ateliê, incrustado em dois cômodos apertados de seu apartamento na Urca, não prima pela assepsia dos ambientes tecnológicos modernos, nele não se encontram computadores e outros sofisticados aparelhos eletrônicos, mas uma parafernália de caixas e recipientes com parafusos, porcas, engrenagens, furadeiras, serras circulantes, lupas, lixadeiras, soldadores, alicates, pequenos tornos. Nesse ambiente de baixa tecnologia ele é, verdadeiramente, um artista-artesão, mas capaz de fazer milagres com seu equipamento rudimentar. E de nos emocionar com suas obras.

sábado, 13 de outubro de 2012

Impasses e possibilidades da arte contemporânea, por Marisa Flórido

 
Artigo de Marisa Flórido originalmente publicado no Segundo Caderno, do jornal O Globo, em 8 de outubro de 2012.

Celebramos um culto vazio, o da própria exposição. Isso coloca as artes visuais em um lugar muito sensível e ambíguo

Em 1851, abria-se em Londres a primeira Exposição Universal (sob o título “Grande exposição dos trabalhos da indústria de todas as nações”), abrigada em um grande edifício de vidro e ferro, projeto de John Paxton, jardineiro construtor de estufas. O Palácio de Cristal, como ficou conhecido, geraria furor no público e contendas na crítica especializada. Como é possível uma arquitetura sem sombras? Interrogava-se então.

Giorgio Agamben especula se Marx não teria pensado no Palácio de Cristal ao escrever “O fetichismo da mercadoria e seu segredo”. Mas o fato é que o palácio não só colocava a mercadoria mas também seus visitantes expostos em uma redoma. É sintomático que um dos primeiros templos da mercadoria traga implícita a fase extrema do capitalismo: o espetáculo. Guy Debord constataria que o capital chegaria a tal grau de acumulação que se tornaria imagem, invadindo a vida social. “O espetáculo não é o conjunto de imagens, mas uma relação social entre pessoas, mediada por imagens.” Na sociedade do espetáculo, não apenas o valor de troca separou-se do valor de uso, falsificando a produção social, como encobriu e submeteu toda a existência. O que definia o homem, como a política, a religião, a linguagem e a sexualidade, foi se retirando para essa dimensão separada, virtual e em permanente exposição. Basta pensarmos no julgamento do mensalão ao vivo em rede nacional, a vida íntima exposta nos reality shows, a disputa pelas almas (e por seus centavos) entre as igrejas em suas tele-evangelizações. As potências da vida em comum foram se abrigando no Palácio de Cristal e seu invólucro de vidro. Inclusive a arte e a cidade.

Nas novas geografias globais, as cidades competem para atrair os fluxos de capital e imagem, concentrá-los e de algum modo materializá-los em símbolos. Competem tanto pelo famoso museu e sua arquitetura extraordinária como para sediar grandes eventos esportivos. O Rio não permaneceria insensível a esse redesenho de forças. Nas últimas décadas, empenharia-se em atrair um grande museu internacional (na área portuária, onde ocorreu a ArtRio), concorreria para sediar grandes eventos esportivos, como as Olimpíadas de 2016. A cidade do espetáculo, tornando-se um grande evento, vive sua extrema exposição e insere-se na era do turismo cultural, uma das indústrias que mais crescem no mundo.
Curioso é como arte e cidade vêm se cruzando nesse redesenho. Arte e cultura vêm sendo usadas para alavancar reformas arquitetônicas e urbanas em áreas degradadas: tanto com a implantação de grandes equipamentos (museus e centros culturais) como com a ocupação de usos afins (ateliês, galerias). A contrapartida perversa desse processo de recuperação é a expulsão de seus moradores, principalmente dos mais pobres, conhecida como gentrificação. Equilibrar a recuperação do patrimônio histórico e urbano com a permanência da população tem sido um dos desafios das políticas urbanas. (Ler Alucinações produtivas. Produção cultural na Zona Portuária? por Cristina Ribas)

A VITRINE DE PAXTON
Faço eco às preocupações de minha colega de coluna, Luisa Duarte, em sua pertinente crítica, de termos o acesso à arte mediado principalmente pelo mercado e sua feira, em que “a experiência para o leigo acaba sendo a de um shopping”. A multidão frenética e ruidosa, a saturação do olhar na confusão das obras, o encontro com pessoas que raramente vão a uma exposição geravam mal-estar. Estávamos todos na vitrine de Paxton, em exposição como as obras, atraídos pelo evento social, pela paisagem, pela vista do mar, com que esta cidade tem laços afetivos e históricos.

Mas o fato é que 70 mil visitantes é um número considerável, e é preciso refletir sobre esse fenômeno. Isso não vem acontecendo apenas na ArtRio, o Rio teve três exposições no ano passado entre as dez mais vistas no mundo, todas no CCBB. Podemos até entender o apelo lúdico da mostra que ocupou o topo do ranking, “O mundo mágico de Escher”, mas isso não se aplica a outra que também esteve entre as dez mais: a de Laurie Anderson. Podemos deduzir suas causas de muitos fatores: a gratuidade, a propaganda intensiva, a atração do espetáculo, o investimento em educação dos centros culturais e das escolas públicas cariocas etc.

Por outro lado, percebemos também outro processo em curso na cidade, o de descentralização das ofertas culturais, a exemplo de iniciativas como o Bela Maré, o Museu da Maré, as Bibliotecas Públicas de Manguinhos e da Rocinha, os pontos de cultura, assim como os espaços independentes de artistas e de coletivos.
O que talvez possamos vislumbrar nisso é uma demanda reprimida, que se manifesta de diversas formas. O poder, hoje, não é mais fundado apenas sobre o uso da violência e o controle da opinião, mas, sobretudo, sobre a manipulação da emoção (com a qual o terrorismo joga) e sobre o monopólio das visibilidades. A exposição em si tornou-se um valor. Celebramos um culto vazio, o da própria exposição. Isso coloca as artes visuais em um lugar muito sensível e ambíguo, tanto de servidão como de resistência. Mas é exatamente por isso que talvez seja, pela arte, que se possa refletir de modo consistente (ainda que problemático) o mundo contemporâneo.

sexta-feira, 12 de outubro de 2012

ATENÇÃO!

Prezados Senhores,
 
Informamos que o Conselho Regional de Museologia 1a Região realizará eleição para preencher 02 (duas) vagas para membros efetivos na Diretoria, referente ao exercício 2013-2015.
 
Desta forma, esperamos até 30 de outubro as candidaturas para dar prosseguimento às ações de valorização e fortalecimento do profissional Museólogo na sociedade.
 
Lembramos que para se candidatar é necessário que o profissional tenha registro e esteja regular junto ao Conselho. A participação na votação é obrigatória.
 
Desde já agradecemos o apoio e cooperação nesta nova eleição para fortalecer nosso importante Conselho.
 
Cordialmente.
 
Antonio Marcos Passos
COREM 0221.I
Presidente do COREM 1R