A abertura da exposição de Tatiana Blass, na Caixa Cultural de Salvador, causou um choque inesperado. Por conhecer o trabalho da artista, com suportes, linhas e expressões de destaque, esperei algo zvodný*. Creditei à decepção um pouco do frisson de vernissage, muitas pessoas, muito barulho e pouca oportunidade fruitiva. Passado algum tempo, retornei para apreciar merecidamente as obras, e nesta nova trilha me deparei com o inusitado: o livro de visitação com severas críticas ao trabalho desta famosa artista.
Por conhecer a fundo a instituição, e por ter tido a oportunidade de vivenciar os mais variados meios comunicativos de cada exposição, posso afirmar que esta é uma das mais criticadas pelo público visitante. As fontes para tal afirmação ultrapassam os registros escritos, são as pessoas, sejam elas atuantes ou não no campo das artes visuais, que saem do contato com as obras de Tatiana Blass fazendo uma pergunta - É só isso?
Permiti-me mais uma caminhada pelo trajeto expositivo - quem sabe não foram os passos que não combinaram - e terminei com a mesma podvod*, mas desta vez consciente do que não me agradou, uma verdadeira pantomima curatorial, somada a primários erros de expografia.
O impacto inicial é de inacabado. Nada contra, quando está é a intenção de quem produz, e não resultado de descaso com a montagem. A visão é de semelhança com um simples depósito de peças, com algo aqui e outro acolá. O discurso da artista, que permeia a teatralidade e experiência estética, desapareceu desta exposição. A iluminação, que deveria favorecer a dramaticidade ocultada no seu cerne, apenas dá uma visibilidade inevitável. A posição das obras é outro problema, que se perdem diante do tamanho das salas expositivas, desfazendo o diálogo que pareciam ter. É tão dissonante que o público acaba se encantando mais com a arquitetura histórica do espaço. E finalmente as informações principais, etiquetas com nomes das obras, pecam pelo tamanho diminuto e posição aleatória, interferindo na percepção do visitante.
Além deste elenco de problemas que comprometem de forma geral a exposição, temos elementos específicos depreciados em sua interação obra-público:
- A obra “O engano é a sorte dos contentes” que, se observada separadamente do contexto expositivo, é de uma qualidade artística indiscutível. Por este motivo faz parte do acervo do MAM, e é amplamente exibido por este. Entretanto, ao ser exposta na Caixa Cultural, causa uma familiaridade pedante, e por já ser conhecida pelos visitantes, perdeu seu brilho, resultando em críticas. É essencial pensar numa mostra dentro de um contexto mais amplo, pois o público que costuma visitar as exposições em Salvador não vive imerso em uma bolha, onde meios externos não afetam diretamente a opinião crítica sobre o que se vislumbra.
- A obra “Quanto menos dorme, quanto menos sono há”, por sua constituição, cria uma idéia interessante de abandono natural. Contudo, no contexto expositivo, ficou abandonado demais, desconectando-se excessivamente da exibição e perdendo seu valor artístico, passando quase despercebida pelos transeuntes. A obra foi comprometida pela posição distante e isolada. Segundo o relato da própria artista, o tema do cão não é mais usado como elemento expressivo. Fica então a questão: por que trazer um tema descartado por sua própria autora, e que já foi apresentado na Bahia? Algo a se pensar...
- O “Cerco” intriga primeiramente pelo faisão taxidermizado, já que não é muito comum ver esse tipo de objeto em um contexto artístico. Um animal tão elegante que dilui seu papel na exposição, por se encontrar no Salão Nobre, onde o teto é ricamente decorado com belíssimos desenhos. Cria-se tensão, distração e perda de foco entre a obra e o teto, prejudicando assim a percepção do visitante. É interessante observar que há uma luz pontual no recinto, suficiente para iluminar apenas a peça e que, se devidamente utilizada, daria uma dramaticidade fantástica ao conjunto, resolvendo o problema da competição com a arquitetura interna. Contudo, todas as luzes permanecem ligadas, como se este recurso houvesse sido esquecido.
A Bahia não possui um grande circuito de arte visuais, e isso acaba fomentando a falsa idéia de que não existe aqui um público crítico e exigente. O descaso do artista, curador e/ou da montagem, ao trazer exibições para o estado, pode acabar sendo um suicídio profissional. Não se deve montar uma exposição sem pensar no possível visitante, tendo sempre como referência a pluralidade humana. E uma artista como Tatiana Blass, que traz em sua estrada palavras de Luiz Camillo Osório e José Augusto Ribeiro, sabe bem a condição de ser especialmente múltipla.
Por conhecer a fundo a instituição, e por ter tido a oportunidade de vivenciar os mais variados meios comunicativos de cada exposição, posso afirmar que esta é uma das mais criticadas pelo público visitante. As fontes para tal afirmação ultrapassam os registros escritos, são as pessoas, sejam elas atuantes ou não no campo das artes visuais, que saem do contato com as obras de Tatiana Blass fazendo uma pergunta - É só isso?
Permiti-me mais uma caminhada pelo trajeto expositivo - quem sabe não foram os passos que não combinaram - e terminei com a mesma podvod*, mas desta vez consciente do que não me agradou, uma verdadeira pantomima curatorial, somada a primários erros de expografia.
O impacto inicial é de inacabado. Nada contra, quando está é a intenção de quem produz, e não resultado de descaso com a montagem. A visão é de semelhança com um simples depósito de peças, com algo aqui e outro acolá. O discurso da artista, que permeia a teatralidade e experiência estética, desapareceu desta exposição. A iluminação, que deveria favorecer a dramaticidade ocultada no seu cerne, apenas dá uma visibilidade inevitável. A posição das obras é outro problema, que se perdem diante do tamanho das salas expositivas, desfazendo o diálogo que pareciam ter. É tão dissonante que o público acaba se encantando mais com a arquitetura histórica do espaço. E finalmente as informações principais, etiquetas com nomes das obras, pecam pelo tamanho diminuto e posição aleatória, interferindo na percepção do visitante.
Além deste elenco de problemas que comprometem de forma geral a exposição, temos elementos específicos depreciados em sua interação obra-público:
- A obra “O engano é a sorte dos contentes” que, se observada separadamente do contexto expositivo, é de uma qualidade artística indiscutível. Por este motivo faz parte do acervo do MAM, e é amplamente exibido por este. Entretanto, ao ser exposta na Caixa Cultural, causa uma familiaridade pedante, e por já ser conhecida pelos visitantes, perdeu seu brilho, resultando em críticas. É essencial pensar numa mostra dentro de um contexto mais amplo, pois o público que costuma visitar as exposições em Salvador não vive imerso em uma bolha, onde meios externos não afetam diretamente a opinião crítica sobre o que se vislumbra.
- A obra “Quanto menos dorme, quanto menos sono há”, por sua constituição, cria uma idéia interessante de abandono natural. Contudo, no contexto expositivo, ficou abandonado demais, desconectando-se excessivamente da exibição e perdendo seu valor artístico, passando quase despercebida pelos transeuntes. A obra foi comprometida pela posição distante e isolada. Segundo o relato da própria artista, o tema do cão não é mais usado como elemento expressivo. Fica então a questão: por que trazer um tema descartado por sua própria autora, e que já foi apresentado na Bahia? Algo a se pensar...
- O “Cerco” intriga primeiramente pelo faisão taxidermizado, já que não é muito comum ver esse tipo de objeto em um contexto artístico. Um animal tão elegante que dilui seu papel na exposição, por se encontrar no Salão Nobre, onde o teto é ricamente decorado com belíssimos desenhos. Cria-se tensão, distração e perda de foco entre a obra e o teto, prejudicando assim a percepção do visitante. É interessante observar que há uma luz pontual no recinto, suficiente para iluminar apenas a peça e que, se devidamente utilizada, daria uma dramaticidade fantástica ao conjunto, resolvendo o problema da competição com a arquitetura interna. Contudo, todas as luzes permanecem ligadas, como se este recurso houvesse sido esquecido.
A Bahia não possui um grande circuito de arte visuais, e isso acaba fomentando a falsa idéia de que não existe aqui um público crítico e exigente. O descaso do artista, curador e/ou da montagem, ao trazer exibições para o estado, pode acabar sendo um suicídio profissional. Não se deve montar uma exposição sem pensar no possível visitante, tendo sempre como referência a pluralidade humana. E uma artista como Tatiana Blass, que traz em sua estrada palavras de Luiz Camillo Osório e José Augusto Ribeiro, sabe bem a condição de ser especialmente múltipla.
* Mais do mesmo
* Sedutor/Apaixonante
* Decepção
* Decepção