Matéria de Fabio Cypriano originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 26 de outubro de 2012.
Livros e caixas são suportes usados e recriados por muitos artistas
contemporâneos. Marcel Duchamp foi um dos primeiros a se utilizar dessa
prática, com sua "Caixa-valise" (1938-1942), na qual apresentava
miniaturas de 61 obras suas.
"Aberto Fechado: Caixa e Livro na Arte Brasileira", com curadoria de
Guy Brett, apresenta um amplo panorama sobre esse tema a partir de uma
ótica local. Brett, crítico e curador inglês, há cinco décadas envolvido
com a produção brasileira, selecionou 90 obras de 23 artistas.
É preciso reconhecer: trata-se de uma das melhores exposições sobre
arte brasileira. Por meio de uma questão original, Brett sintetiza
alguns dos pontos centrais da produção nacional com obras absolutamente
precisas.
"Ninhos" (1969), de Hélio Oiticica, é um bom exemplo. Penetrável
criado para a galeria Whitechapel, em Londres, é composta por seis
caixas recheadas de materiais distintos, que permitem a interação com o
espectador. Assim, ao contrário das caixas de artistas europeus ou
americanos até então produzidas, confirma-se que, no Brasil, o
rompimento da relação formal com o objeto artístico através da
participação do espectador é um eixo central.
Nesse caso estão ainda obras icônicas como "O Ovo" (1968), cubo de
papel que pode ser rompido pelo visitante, ou "Caixa Brasil" (1968),
estojo que contém mechas de cabelo de índios, europeus e africanos,
ambos de Lygia Pape.
Nesse último trabalho, com os cabelos dispostos de acordo com sua
ocupação no país, a começar pelos índios, percebe-se um novo viés. Obras
como "Caixa Brasil" dizem respeito à política de uma forma global, no
caso o significado da cultura brasileira. Esse viés também é percebido
com "Livro de Carne"(1978-1979), registros de um livro feito de carne,
por Artur Barrio, num momento em que havia tortura em prisões
brasileiras.
Assim, a mostra desdobra-se em múltiplas dimensões, da política à
formal, como a influência construtiva nas obras de Raymundo Collares,
caso de "Gibi de Bolso"(1971).
Outro mérito é que os textos que acompanham as obras não são
divagações generalistas, como tem ocorrido com frequência, mas
explicações dos próprios artistas sobre seus trabalhos.
A exposição ainda é acompanhada por um catálogo exemplar, com ensaios
de fôlego, imagens de todos os trabalhos expostos e depoimentos dos
artistas. Contudo, acima de tudo, "Aberto Fechado" é uma reunião de
excelentes trabalhos.
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