sábado, 25 de agosto de 2012

Análise: É possível reduzir riscos para manter obras de arte.


Matéria de Marcos Augusto Gonçalves originalmente publicada na Ilustrada do jornal Folha de S. Paulo em 15 de agosto de 2012.

E as chamas levaram "Samba", obra realizada depois da fundamental viagem de Di Cavalcanti a Paris e três anos após a Semana de Arte Moderna --evento que nasceu, aliás, de uma ideia do pintor.
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Esse exemplo vigoroso do esforço modernista de configurar uma expressão nacional na arte apareceu num tempo em que as peripécias mais radicais e incomunicáveis das vanguardas eram "corrigidas" por uma onda que se convencionou chamar de "retorno à ordem".
O movimento que revalorizava a figura vinha a calhar para os modernistas interessados em delinear uma temática "nossa". No caso de Di tratava-se de representar o homem, ou a mulher brasileira negra e miscigenada, no contexto da cultura popular.
Para alguns, uma obra-prima como "Samba" não poderia estar em outro lugar que não um museu ou uma instituição pública. Dessa forma estaria mais protegida e acessível ao público.
Embora nem sempre nossos museus mostrem regularmente as preciosidades que possuem, é presumível que, se estivesse num deles, a tela "Samba" poderia ser mais vista. Quanto a ficar mais protegida, já não parece tão certo.
A maior parte da obra do grande artista uruguaio Torres-García foi destruída pelo fogo no Museu de Arte Moderna do Rio. E incêndios em museus, mesmo em países ricos e que dão mais valor a seu patrimônio do que o Brasil, também acontecem.
Diante da tragédia, não é incomum o apelo desesperado a alguma instância salvadora que poderia evitá-la. Pode ser uma divindade qualquer ou o Estado. Não parece razoável, contudo, que o Estado simplesmente "tombe" ou sequestre obras de pessoas que as adquiriram, sob o argumento de que irá cuidar melhor do patrimônio.
Em tese, colecionadores privados são os maiores interessados em manter suas peças em boas condições. Se nem sempre o fazem, é de fato um problema.
Outras soluções podem ser imaginadas. Por exemplo: não seria impossível para um órgão público ou privado mapear obras cruciais como "Samba", entrar em contato com os donos e compartilhar projetos de segurança. É sempre possível reduzir riscos, e tudo deve ser feito nesse sentido. Nada, porém, impedirá que fatalidades continuem a acontecer.

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